Mudar a forma de exercer o poder municipal

Defender, valorizar <br>e transformar a Horta

Miguel Inácio
As maiorias absolutas têm, nos Açores, uma elevadíssima quota-parte de responsabilidade por todos os desvios, distorções, manobras ilegítimas e opções erradas que marcaram de forma demasiadamente forte a governação açoriana desde sempre. No dia 9 de Outubro, os faialenses deram o melhor resultado absoluto de sempre à CDU, o que lhes dá uma garantia sólida de que o Faial será melhor defendido e desenvolvido.

A Horta vai entrar numa via de transformação e de evolução

Uma boa parte da luta política da CDU e do PCP na região dos Açores tem sido dedicada ao combate às maiorias absolutas. Nesta ilha, tanto o PS como o PSD, ao longo dos sucessivos actos eleitorais, têm atingido os seus objectivos, alcançando, ora um ora outro, em prejuízo da população, sempre a maioria no Executivo da Câmara Municipal da Horta.
Entretanto, nas últimas eleições autárquicas, um novo ciclo político iniciou-se. No que toca à autarquia, os resultados, dada a proximidade entre os três maiores partidos do concelho, determinaram uma composição de três lugares para o PS, dois para o PSD e dois para a CDU.
Em entrevista ao Avante!, José Decq Mota afirmou que chegou o momento de demonstrar que é possível, com respeito pela autonomia própria de cada força política, governar-se um município com estabilidade e eficácia, sem que haja maioria absoluta de um só partido.
«O nosso resultado foi de 27 por cento, tendo a CDU elegido dois vereadores para a Câmara Municipal, o que deu uma perspectiva de equilíbrio político», explicou o vereador comunista, assegurando que «esta é uma situação pouco vulgar aqui no Faial, havendo, por isso, uma anulação da bipolarização».
No entanto, continuou, «este não é um processo de geração espontânea». «O Partido e a CDU sempre tiveram, na ilha do Faial, um influência social e uma expressão eleitoral superiores à média regional nas áreas urbanas. Nas três freguesias da Horta, por exemplo, chegámos, várias vezes, aos 10 por cento, o que era um bom resultado. No campo a nossa votação rondava os 0,5 e os 1,5 por cento. A partir de 1997, rompemos com esta área e, nesse ano, sou eleito vereador com 22,5 por cento dos votos», relatou José Decq Mota.
Fruto da conjuntura política, nacional e regional, nas eleições autárquicas seguintes a CDU não elegeu qualquer vereador, embora se mantivesse o grupo na Assembleia Municipal. Em 2004, a CDU sofre uma nova derrota, perdendo o seu deputado regional. Durante a campanha eleitoral gerou-se um movimento sem precedentes de bipolarização que depois correspondeu à concentração de votos no PS. «Houve um “chupar” de votos, com base em notícias falsas, nomeadamente da RTP1 e da SIC, que davam uma sondagem onde tudo estava empatado, o que levou a que a CDU perdesse um deputado no Faial e outro nas Flores», denunciou o comunista.
No ano seguinte, para as eleições autárquicas de 2005, os comunistas, de uma forma intensa e consequente, «arregaçaram as mangas» e apresentaram-se ao eleitorado como a alternativa à estagnação existente no concelho.
«A nossa candidatura demonstrou ser de grande qualidade e de grande abertura política, mantendo, como sempre, profundas ligações com as populações, procurando estar junto delas», destacou Decq Mota, acentuando, por outro lado, o papel dos independentes nas listas da CDU, «que, descontentes, depois de trabalharem connosco aproximam-se do nosso projecto e hoje, muitos, são militantes do PCP».

Dinamização política e democrática

Entretanto, logo após as eleições, através de um entendimento entre o PS e a CDU, criou-se uma perspectiva de estabilidade governativa para a autarquia. A realização de um vasto diálogo político, a participação dos vereadores da CDU nas funções executivas e de representação da Câmara e a dinamização política e democrática da Assembleia Municipal são e foram os caminhos a seguir na valorização da acção do município da Horta.
«O PS teve que aceitar uma enorme transformação do seu trabalho, nomeadamente no aumento do investimento municipal comunitário, melhorando o saneamento básico, o abastecimento de água, a rede de estradas e caminhos municipais, a recuperação da imagem urbana e actualização do Plano de Urbanização, a conclusão de planos de pormenor, e a regulamentação do trânsito, entre outras», disse Decq Mota, sublinhando que, da parte da CDU, «não fazemos cedências, até porque nos dispusemos a trabalhar numa base de entendimento que acentua verdadeiramente, cada ano, no Plano de Actividades que se acorda. Supúnhamos que o PS não contemplasse estas áreas, é evidente que não era um plano sustentável».
Depois, continuou, há os programas quadrienais, ou seja, os projectos que se querem concluir ou desenvolver nos próximos anos. «Nós, por exemplo, temos a intenção de construir o Pavilhão Multiusos, mas ainda não há um sítio, não há um projecto, no entanto tem que ser inscrita, este ano, uma verba que dê para os estudos, para que no ano que vem possa ser agendado um projecto de execução e que nos dois anos seguintes seja executado», disse o autarca do PCP, referindo, no entanto, «que não lhe repugna a ideia que alguns projectos não estejam concluídos até 2009, mas é preciso que sejam lançados».
A CDU, no seu programa eleitoral, tem ainda como objectivo o alargamento do Porto da Horta, o aumento da pista do aeroporto, a construção da Biblioteca Pública, entre outras, que serão prioridades no relacionamento do município com os governos da República e da Região.
«Eu acho que a Horta vai entrar numa via de transformação e de evolução», terminou.

Ganhar a Câmara Municipal

Atendendo à evolução dos resultados alcançados e à credibilidade que se tem vindo a adquirir, Decq Mota, não descarta a possibilidade de a CDU vir, um dia, a ganhar a Câmara Municipal da Horta.
«Quando temos, no concelho, três forças políticas, uma com 38 por cento (PS), outra com 31 por cento (PSD)e outra com 27 por cento (CDU), eu tenho a ideia de que tudo pode acontecer», afirmou convicto, lembrando que «as próprias sondagens diziam que a diferença entre o mais votado e o menos votado era inferior ao número de indecisos, ou seja, o resultado final ia depender daqueles que não têm partido».
Se isso se vier a dar, destacou, «o que será feito é uma ampliação do estilo e da motivação daquilo que a CDU está a procurar fazer nos pelouros que tem actualmente», disse Decq Mota, lembrando, que, naquele dia, a vereadora da CDU, Maria do Céu Barroca Brito, tinha aparecido num programa chamado «Bom Dia Açores», e «percebeu-se logo, ouvindo-a, que a potencialidade dela e da força política que ela integra, de tratar as questões da cultura são enormes».
O autarca do PCP disse ainda que o exemplo da Horta pode e deve ser seguido por todas as outras ilhas do arquipélago. «Quando se consegue romper com a bipolarização, entre duas forças políticas, a verdade vem sempre ao de cima. Com este resultado e com esta prática, possibilitamos que uma série de problemas que existem no concelho possam ser resolvidos. Quando digo um bom resultado estou a falar das Flores, que em 1989 passou a ser a segunda força política da ilha e elegeu um deputado para a Assembleia Regional», disse, terminando, numa mensagem de esperança e convicção: «Este salto pode ser dado por outras ilhas. Quando falo no projecto da CDU, penso na proximidade com as pessoas, com a comunidade social, envolvimento das pessoas na resolução dos problemas, dinamização cultural, minorar as questões sociais que estejam ao alcance das autarquias».

Um resultado histórico

Para Leonor Dutra, responsável pela Comissão de Ilha do PCP, este é um resultado histórico para as gentes do concelho da Horta, «até porque se conseguiu quebrar a tradicional bipolarização que existia na Câmara Municipal».
«As pessoas fartaram-se deste tipo de gestão prepotente, que não ouvia as pessoas, uma má gestão em variadíssimos aspectos. De facto souberam ver quer isto necessitava de uma grande mudança a sério, votando na CDU», afirmou, sublinhando que este resultado «dá boas perspectivas para os próximos anos».
«A população confiou nas nossas propostas, perceberam que de facto nós tínhamos condições para fazer um trabalho sério, sem nunca perdermos a nossa identidade. No compromisso que fizemos com o PS ficou claro que mantemos os nossos princípios, a nossa capacidade de iniciativa, até porque não temos uma coligação com o PS, nem um apagar das nossas ideias perante a maioria que está na Câmara», acrescentou a responsável do PCP.
Leonor Dutra frisou ainda as diferenças, já visíveis, entre o trabalho dos eleitos da CDU e das outras forças políticas. «O nosso estilo de governação é diferente dos outros partidos e as pessoas já se aperceberam que nós as ouvimos, tentamos resolver os seus problemas. Estou convencida que no final do mandato isto pode servir de exemplo para outros municípios, naquilo que é um trabalho a sério.»

Faial
Ilha azul

Situada no extremo ocidental do Grupo Central do Arquipélago dos Açores, a ilha do Faial está separada da ilha do Pico por um canal de cerca de oito quilómetros de largura. Tem uma área de 173,42 quilómetros quadrados e uma população de 16 mil habitantes.
De origem vulcânica, é a ilha açoriana mais sujeita a sismos. A sua forma é de um pentágono irregular (25 km x 20 km), e tem ao centro a Caldeira com 1021 metros de altitude e o seu ponto mais alto é o Cabeço Gordo com 1043 metros.
Descoberta na primeira metade do século XV, o início do seu povoamento deu-se por volta de 1460. O seu rápido crescimento económico ficou a dever-se em grande parte à cultura do pastel, planta que fornecia a cor azulada que era bastante utilizada pelos tintureiros.
A Ilha do Faial é também bastante conhecida como «Ilha Azul» devido à grande quantidade de hortênsias que florescem na ilha nos meses de Verão.
Esta ilha tem como capital a bela cidade da Horta, com o seu muito conhecido porto de mar e marina, paragem quase obrigatória a todos veleiros atravessam as águas do Atlântico Norte.
A ilha do Faial guarda ainda alguns moinhos de vento que emprestam rara beleza a certos recantos da sua paisagem. Os campos do Faial produzem batata, cereais, fruta e vinha e criam gado bovino que alimenta a indústria de lacticínios e carnes.


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